A Reforma Tributária do Consumo vai muito além da criação da CBS e do IBS. Ela inaugura também o Imposto Seletivo (IS), um tributo de função extrafiscal voltado a produtos e atividades considerados prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como álcool, cigarros, bebidas açucaradas e determinados bens minerais. Inspirado em modelos de IVA adotados em mais de 170 países e combinado a uma alíquota agregada estimada de até 28%, o novo desenho tributário promete simplificar o sistema, mas ao mesmo tempo pressiona empresas a rever preços, margens, estratégias comerciais e sua própria agenda de responsabilidade socioambiental.
O modelo brasileiro de IVA dual, com CBS (federal), IBS (subnacional) e Imposto Seletivo, busca modernizar a tributação e aumentar a transparência em um cenário em que empresas ainda gastam mais de 1.500 horas por ano para cumprir obrigações tributárias e convivem com centenas de milhares de normas editadas desde 1988. Dentro desse contexto, o IS surge como instrumento de política pública: tributar mais fortemente aquilo que gera custos sociais e ambientais relevantes.
Por Thiago Leite — Especialista em Inteligência Tributária e Sócio da L4 Taxx.
O novo modelo tributário: CBS, IBS e Imposto Seletivo
A Reforma Tributária extingue gradualmente tributos como PIS, Cofins, ICMS, ISS e IPI, substituindo-os por três pilares:
- CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) – de competência federal;
- IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) – gerido por estados e municípios, via Comitê Gestor;
- IS (Imposto Seletivo) – tributo de caráter extrafiscal, voltado a bens e serviços considerados nocivos à saúde e/ou ao meio ambiente.
O modelo se inspira em sistemas de IVA adotados na União Europeia, China, Índia e Austrália, com forte ênfase em não cumulatividade plena e transparência da carga tributária ao longo da cadeia. A alíquota agregada de bens e serviços, projetada em torno de 26,5% mais o Imposto Seletivo em determinados casos, coloca o Brasil entre os países com maiores alíquotas globais, aumentando a importância de planejamento e eficiência.
Imposto Seletivo: função extrafiscal e lógica do “imposto do pecado”
O Imposto Seletivo não foi criado apenas para arrecadar mais. Sua função principal é desestimular o consumo de bens e serviços com efeitos negativos relevantes:
- Sobre a saúde – como cigarros, bebidas alcoólicas e bebidas açucaradas; e
- Sobre o meio ambiente – como determinados veículos automotores e bens minerais extraídos.
Por isso, o IS ganhou o apelido de “imposto do pecado” em referência a modelos internacionais que tributam tabaco, álcool e outros produtos danosos.
Algumas características centrais:
- Não permite crédito tributário ao longo da cadeia – a incidência é concentrada, com cobrança integral na primeira comercialização;
- Tem alíquotas variáveis, calibradas conforme o grau de nocividade do produto;
- Opera como um complemento à CBS/IBS, elevando a tributação de segmentos específicos.
Alíquotas indicativas e bens alcançados pelo Imposto Seletivo
De acordo com debates e propostas constantes no PLP nº 68/2024 e discussões correlatas, o desenho do Imposto Seletivo considera:
- Cigarros e demais produtos fumígenos;
- Bebidas alcoólicas (com atenção ao teor alcoólico);
- Bebidas açucaradas (como refrigerantes e sucos industrializados);
- Bens minerais, como minério de ferro, petróleo e gás natural;
- Veículos, inclusive elétricos e poluentes, com regras ainda em evolução.
Valores discutidos publicamente incluem, por exemplo, alíquotas significativamente mais altas para cigarros e bebidas alcoólicas, percentuais intermediários para bebidas açucaradas e incidência de menor alíquota para certos bens minerais, como minério de ferro, petróleo e gás natural, muitas vezes combinada com alíquota zero para usos específicos (como gás natural empregado como insumo industrial).
| Segmento | Racional do Imposto Seletivo | Direcionamento esperado |
|---|---|---|
| Produtos fumígenos | Desestimular o tabagismo e reduzir custos em saúde pública. | Aumento relevante de preços, queda de consumo e reequilíbrio arrecadatório. |
| Bebidas alcoólicas | Reduzir danos associados ao consumo excessivo. | Rever estrutura de preços e portfólio, com foco em elasticidade da demanda. |
| Bebidas açucaradas | Combater doenças associadas ao consumo de açúcar. | Incentivar reformulações de produto e mudanças de posicionamento. |
| Mineração e recursos naturais | Internalizar parte dos impactos ambientais e extrativos. | Rever contratos, margens e modelos de repasse. |
Evidências em saúde pública: por que tributar álcool e tabaco
Os dados de saúde pública reforçam o sentido extrafiscal do IS:
- Em 2019, quase 105 mil mortes no Brasil foram atribuídas ao consumo de álcool;
- Organismos internacionais apontam que aumentar impostos, restringir publicidade e reduzir disponibilidade são medidas com melhor custo-benefício para mitigar danos;
- Estudos indicam que cada 1 dólar investido em políticas fiscais e regulatórias gera múltiplos de retorno em benefícios econômicos e sociais.
No caso do tabaco:
- Políticas tributárias mais agressivas tendem a reduzir consumo e prevalência de fumantes;
- Períodos sem reajuste real de tributos, como ocorreu com o IPI, aumentam a acessibilidade do cigarro e fragilizam o efeito das medidas de saúde pública;
- Estudos estimam que elevações robustas de alíquotas poderiam evitar dezenas de bilhões de reais em custos com assistência à saúde, ao mesmo tempo em que ampliariam a arrecadação tributária.
Bebidas alcoólicas, cerveja e efeito de substituição
A proposta de graduar alíquotas do IS pelo teor alcoólico das bebidas tem lógica sanitária, mas precisa dialogar com a realidade do consumo brasileiro:
- A cerveja responde por cerca de 90% do mercado de bebidas alcoólicas;
- A tributação historicamente mais branda sobre cerveja e mais pesada sobre destilados pode baratear artificialmente a bebida de maior consumo;
- Isso gera risco de efeito de substituição: consumidores migram para produtos de menor teor, mas com maior volume, sem reduzir efetivamente danos.
Experiências passadas, como a redução de alíquota de IPI para cerveja e o aumento para outras bebidas, mostram que calibragens inadequadas:
- Podem reduzir arrecadação global;
- Distorsionar o mercado em favor de determinadas categorias;
- Minar o objetivo de saúde pública que justificou a intervenção.
Bebidas açucaradas, Zona Franca e tributação seletiva
No caso das bebidas açucaradas:
- Refrigerantes e sucos industrializados têm consumo elevado, impulsionado por preços relativamente baixos;
- Incentivos como isenções de IPI na Zona Franca de Manaus reduziram o custo de produção de xaropes concentrados;
- A nova tributação busca recompor, ao menos em parte, esse diferencial, alinhando o preço ao impacto em saúde.
Ao mesmo tempo, o foco apenas em bebidas açucaradas – e não em ultraprocessados em geral – suscita debate:
- Há risco de migração do consumo para outros produtos igualmente nocivos, mas menos tributados;
- O desenho do IS, se não for ampliado ou combinado com outras medidas, pode ter impacto parcial na agenda de alimentação saudável.
Mineração, clima e um avanço ainda limitado
Na mineração, o IS recai sobre:
- Minério de ferro;
- Petróleo;
- Gás natural (com previsão de alíquota zero quando usado como insumo industrial).
O recorte sinaliza uma preocupação mais arrecadatória do que propriamente uma reordenação profunda de incentivos ambientais. O mesmo ocorre quando se observa o tratamento a setores intensivos em carbono, como veículos e parte da cadeia de combustíveis.
O desenho atual transmite a sensação de um avanço importante, porém ainda tímido frente à magnitude da crise climática, lembrando a crítica de que se reconhece a gravidade do problema, mas se responde com ajustes graduais.
Análise técnica — Thiago Leite
“O Imposto Seletivo é um dos instrumentos mais poderosos da Reforma Tributária para alinhar tributação, saúde pública e meio ambiente. Mas o impacto efetivo vai depender menos do rótulo ‘imposto do pecado’ e mais de detalhes de alíquota, base de cálculo, incidência e exceções.
Para as empresas, o recado é claro: não se trata apenas de pagar mais imposto em alguns segmentos, mas de rever modelos de negócio, estratégias de preço e posicionamento. Em muitos casos, o IS vai redefinir a fronteira entre produtos economicamente viáveis, socialmente aceitáveis e politicamente sustentáveis.”
– Thiago Leite, L4 Taxx
Estudos de Caso L4 Taxx – Imposto Seletivo na prática
A seguir, três exemplos de como a L4 Taxx pode apoiar empresas de setores diretamente impactados pelo Imposto Seletivo.
Estudo de Caso 1 – Indústria de bebidas alcoólicas
- Contexto: portfólio com cerveja, destilados e RTDs, forte exposição ao varejo nacional.
- Desafio: entender como o IS, graduado por teor alcoólico, afeta margens, preços e mix de produtos.
- Diagnóstico L4 Taxx: modelagem de cenários de alíquotas, elasticidade de demanda e impacto sobre rentabilidade por categoria.
- Plano de ação: ajustes de portfólio, revisão de políticas promocionais e estratégia de repasse.
- Resultado: preservação de margens em linhas estratégicas e redução do risco de perda abrupta de competitividade.
Estudo de Caso 2 – Fabricante de refrigerantes e bebidas açucaradas
- Contexto: operação com unidade na Zona Franca de Manaus e rede de engarrafadoras regionais.
- Desafio: avaliar o impacto do IS sobre o preço final e a atratividade das embalagens de maior volume.
- Diagnóstico L4 Taxx: análise de tributos atuais, simulações de cenários de IS e identificação de pontos de desequilíbrio por canal.
- Plano de ação: estratégias de reformulação, reposicionamento de portfólio e revisão de mix por canal.
- Resultado: estratégia de transição que mitiga choque de preços e preserva participação de mercado.
Estudo de Caso 3 – Grupo de mineração e energia
- Contexto: exploração de minério de ferro e operação integrada com logística de exportação.
- Desafio: mensurar o efeito do IS em contratos de longo prazo e na competitividade internacional.
- Diagnóstico L4 Taxx: estudo da interação entre IS, tributos setoriais e regimes já existentes.
- Plano de ação: revisão de cláusulas contratuais, cenários de repasse e análise de impactos em fluxos de caixa futuros.
- Resultado: maior previsibilidade tributária e base robusta para negociação com clientes e investidores.
FAQ – principais dúvidas sobre o Imposto Seletivo
O Imposto Seletivo substitui o IPI?
Em grande medida, sim. O IS assume a função extrafiscal que antes recaía majoritariamente sobre o IPI, mas com foco ainda mais direcionado a produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.
O IS gera créditos ao longo da cadeia, como a CBS e o IBS?
Não. O Imposto Seletivo é desenhado justamente para não permitir compensação de créditos, recaindo de forma concentrada na cadeia e reforçando seu caráter de desestímulo ao consumo.
As alíquotas do IS serão fixas ou variáveis?
Serão seletivas e variáveis, definidas em lei ordinária, com gradação conforme o grau de nocividade ou impacto socioambiental do produto ou serviço.
O IS vale também para exportações?
O desenho prevê, em regra, isenção para exportações, com exceções em segmentos específicos, como alguns produtos minerais, energia elétrica e telecomunicações, conforme previsto nas normas complementares.
Empresas poderão planejar para neutralizar o efeito do IS?
O IS é justamente desenhado para ser pouco “neutralizável”. O planejamento passa menos por evitar o imposto e mais por repensar portfólio, posicionamento, preços e estratégias de mitigação de risco.
Quando o Imposto Seletivo começará a produzir efeitos econômicos relevantes?
Os efeitos começam com a aprovação definitiva das leis complementares e ordinárias e se intensificam à medida que as alíquotas forem calibradas, os sistemas ajustados e o repasse de preços chegar ao consumidor final.
Como a L4 Taxx pode apoiar minha empresa diante do IS?
A L4 Taxx atua justamente na análise tributária estratégica: mapeando impactos do IS, projetando cenários de carga, avaliando riscos regulatórios e apoiando decisões de preço, portfólio e posicionamento em setores afetados.
Fontes e referências técnicas: textos da Reforma Tributária do Consumo, propostas de regulamentação do Imposto Seletivo, estudos de saúde pública e análises setoriais sobre álcool, tabaco, bebidas açucaradas e mineração.
Como a L4 Taxx pode apoiar sua empresa
O Imposto Seletivo não é apenas uma “camada extra” de tributação: ele redefine o equilíbrio econômico e reputacional de diversos setores. A L4 Taxx apoia empresas a transformar esse cenário em estratégia.
Mapeamento de impacto do Imposto Seletivo
- Análise da exposição da empresa ao IS por linha de produto e canal.
- Simulações de carga tributária combinada (CBS, IBS e IS).
- Identificação de pontos críticos em margens e competitividade.
Estratégia tributária e de precificação
- Modelagem de cenários de repasse de preços.
- Avaliação de elasticidade da demanda por categoria.
- Suporte na revisão de políticas comerciais e contratuais.
Governança tributária e acompanhamento normativo
- Monitoramento contínuo da regulamentação do IS.
- Atualização de matrizes tributárias e diretrizes internas.
- Suporte em debates setoriais e posicionamento institucional.
Quer entender o impacto do Imposto Seletivo no seu setor?
A L4 Taxx pode apoiar sua empresa a mapear riscos, simular cenários e construir uma estratégia tributária sólida frente ao novo modelo de CBS, IBS e IS.
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